quinta-feira, 23 de julho de 2015

Numa dessas conversas...





Para ouvir: Wonderwall - Oasis

-André, você acha que um dia vai se casar? –ela começou, depois de dar um gole em sua cerveja.
-Ah, lá vem ela... –o rapaz se mexeu desconfortável no banco. –O que tem em sua bebida?
-Anda, fala logo. É uma pergunta como tantas outras. –ela encerrou em costumeiro tom autoritário. –Odeio essa música, vou mudar.
-Ah, Mari. Sei lá. Nem gosto de falar dessas coisas, a gente acaba atraindo. –André deu uma risadinha, mas Mariana o encarou firme de volta e ele se adiantou em continuar –Certo, vamos lá. Casar? Bom, - passou uma das mãos pela barba espessa. –Acho que para algumas pessoas é algo tão certo como um e um são dois; para outras não passa de uma opção de vida e não me parece errado fazer escolhas diferentes...
Mariana encarou-o, pesando suas palavras, mas virou-se para o banco de trás num repente.
–Já te disse que acho uma pobreza a gente beber cerveja de supermercado dentro do seu carro? –ela abriu o isopor e pegou uma bebida.
-Ih, não começa. Depois que namorou esse último babaca você pegou umas manias de grandeza. Só porque o cara era rico –ele abriu a long neck com uma das mãos –To quebrado esse mês. –completou emburrado. -E larga de ser ingrata que esta é uma das vistas mais bonitas da cidade.
-Você fala como se eu só tivesse namorado ele porque é rico..! –ela adiantou em se defender.
-Te dizer que eu prefiro acreditar que sim viu. Cara estranho da porra, conversava nada com nada, viajava duas horas pra entender suas piadas... Ou, deve ser que era amor mesmo! Hahahaha!
-Detesto como você sempre fala mal dos meus namorados. –Mariana cruzou os braços irritada.
-A culpa não é minha se você só se sente atraída por babacas...
A moça abriu a boca para responder, mas recostou-se no banco, amuada. 
Percebendo que aquilo fora demais, até mesmo para uma brincadeira, André mudou de assunto.
-E você, Mari?
-Eu o quê?
-O casamento, ora! Você quer se casar um dia?
Mariana tomou um gole de sua cerveja e suspirou profundamente. Era amargo de ouvir, mas a verdade é que André estava certo e ela às vezes se via insegura demais para dizer não aos rapazes que lhe apareciam, por mais que não fossem exatamente o que esperava de um namorado. Perdeu os olhos no horizonte. E ainda o casamento, o que é que achava daquilo?
-Não sei, André. Eu fico confusa, sabe. –começou sem tirar os olhos das luzes da cidade –A impressão que tenho é que é a próxima etapa do Jogo da Vida e não tem como seguir em frente sem passar por ela. É o que todo mundo espera que aconteça: um companheiro, uma casa, filhos e um cachorro. –ela mexeu no cabelo, como sempre fazia quando estava triste. -Mas eu...
-Você é diferente, eu sei. –ele completou –E você detesta o óbvio, eu também sei.
-Sim! –ela virou de lado e encarou-o. –É tão óbvio o rumo das coisas! É tão previsível que chega ser entediante..! –terminou exasperada.
-Por outro lado... –André continuou e ela permaneceu em suspense, esperando que ele, mais uma vez, dissesse em voz alta seus próprios pensamentos. –Você também tem medo da solidão e imagina que um companheiro pra vida toda não seria uma má ideia.
-Eu não sei, André! Eu achei que quisesse me casar... –Mariana disse com voz embargada –Mas se eu o amasse, não teria entrado em pânico quando ele me pediu em casamento, certo? Eu sabia que não daríamos certo, sempre soube... –o rapaz abriu a boca para interromper, mas ela fez sinal com a mão. –Só que me imaginar ao lado dele para sempre foi o suficiente para me fazer enxergar o era claro.
-...que você nunca foi apaixonada por ele. -André baixou a voz. -Então qual é o problema, Mari? Me parece que você fez uma escolha certa e deveria estar se sentindo feliz por isso.
-E esse medo aqui dentro? Esse medo de não encontrar outra pessoa? De dar espaço a alguém novo? De quebrar a cara mais tantas vezes... André, e se... –ela parou e engoliu um nó na garganta. –E se ninguém mais se interessar? E se era pra ser ele e eu fui exigente demais?
O rapaz encarou-a confuso por um instante para depois aproximar-se devagar.
-Você não pode ta falando sério. Aquele cara... Ser o cara da sua vida? Mariana, você pode ter muitos defeitos e ter cometido muitos erros, mas nada justifica tamanha punição! Hahaha! –ele riu da própria piada, mas logo se recompôs, diante do olhar triste da amiga. –Olha pra você, garota..! Não vou dizer dos atributos físicos que deles você já tem certeza, e ainda que não os tivesse... Você é engraçada até quando tenta ser séria e a sua risada, meu Deus, sua risada acorda as pessoas. Você é legal, Mari. Longe da TPM você é legal.
-Mas eu detesto beber cerveja de supermercado dentro do carro.
-Um pouco esnobe, eu diria... –ele adiantou. –Coisa que dá pra corrigir. Agora para de pensar nisso. A vida não começa depois do casamento, ou depois da casa, ou depois dos filhos. Já tá acontecendo aqui, bebendo essa porcaria nesse carro velho, ao lado desse gato aqui. E como eu te falei na festa de formatura, se tudo der errado e a gente se cansar de ser solteiro, eu faço o sacrifício e caso com você. Vai ser difícil, eu sei... Vou me arrepender assim que disser "Eu aceito", sei também... Mas poderemos vir pra cá beber sempre que nos sentirmos entediados.
-Vamos ter que trazer as crianças... 
-Sim. A gente solta elas aqui.
-Tipo cachorro, André, que horror! Hahaha!
-Mas a gente põe naquelas coleiras de travar, sabe? Que aperta o botão pra não esticar mais? Serão lindos, nossos sete filhinhos...

Mariana bebeu mais um gole de sua cerveja (Nem tá gelada, André!), implicou com seu melhor amigo e perdeu-se em suas tantas gargalhadas que acendiam a cidade.

-Ah, Mariana... Se você se visse através dos meus olhos...