No começo, bem no começo, eu achava que
terapia fosse uma encheção de saco estilo “Um dia daqueles” e demais livrinhos
autoajuda que mandam relatar a experiência de abraçar uma árvore. Não me
julguem, eu nunca havia experimentado tal tratamento, mas sendo metida a opinar
sobre tudo, essa era minha opinião. “Veja bem”, eu me pegava zombando “como é
que a pessoa diz ‘Não fique triste’ e aí a gente, pá, simplesmente
não fica? Eu não perco meu tempo”.
Porém os tortuosos caminhos da vida nos
levam a pagar a língua, de modo que em uma devastadora manhã de sábado deixei
de lado meus preconceitos e me rendi a uma primeira sessão de terapia. Tão
deprimida estava que de cética passei logo a crente fervorosa: minha terapeuta
era a tábua do náufrago, as sessões curariam milagrosamente a melancolia que eu
carregava nos olhos e meus dias seriam todos de sol. “Como não pensei nisso
antes? Procurar ajuda profissional... Tão óbvio, certo?”.
Então.
Por um tempo levei comigo essa estúpida
certeza de que sessões de terapia serviam para nos tornar instantaneamente
felizes. Entra na sala chorando, sai sorrindo, magic; afinal aquele
tal profissional não possuía em qualquer canto de sua bolsinha a fórmula exata
do amor, do sucesso, da alegria, da coragem, do modo de ver a vida? Não, ele
não possuía e nem possui. Não existe fórmula, nem tutorial no Youtube, nem
palestra motivacional que te faça chegar lá. Existe o mundo te encarando e você
encarando o mundo de volta. E quando nos perdemos numa dessas voltas, seu amigo
terapeuta em vez de lhe responder feito um oráculo “Termina esse namoro, minha
filha”, ou “Muda de cidade, amigo”, faz muito melhor: te leva numa dessas
viagens espaciais entre passado, presente e futuro, pontuando erros e acertos,
preferências e anseios, fracassos e vitórias, e de repente, voilà, cê continua
sem uma resposta concreta, mas algo no fundo de seu coração, talvez
ali atrás da porta, sussurra “Já sabe o que deve fazer, né?”.
Muitas vezes, depois de intensos
debates travados entre eu, eu mesma e meu amigo terapeuta,
cheguei a conclusões que me deixaram satisfeitíssima com a vida e saí da
terapia certa de que esse negócio fazia a gente feliz mesmo, ponto final e bora
todo mundo abraçar a árvore.
Entretanto noutras vezes colocamos as
cartas na mesa, amigo terapeuta e eu, e ao final da sessão eu estava triste,
mas triste de não ter fim, a ponto de sair daquela sala e ir direto embora para
Pasárgada com a passagem só de ida no bolso. Veja bem: eu e eu
mesma não chegamos a um consenso e eu não saberia lhes dizer quão
doloroso foi me aconselhar a fazer exatamente o contrário do que meu coração
tolo ansiava. A um lado, a criança apaixonada insistia dizendo “Mas eu quero
tanto, tanto...”, enquanto as experiências, histórias e os
objetivos arrematavam feito uma ríspida mãe, “Hoje não” e mais tarde, em um
futuro não sei quão distante, talvez eu fosse capaz de me agradecer por ter
deixado de alimentar felicidades clandestinas com mentiras sinceras... Não sei.
Sei que há os dias bons e os dias ruins.
Entre idas e vindas de terapias entendi
que, por sorte, ninguém prometeu curar a persistente melancolia de minha alma
ou essa mania de conversar com folhas em branco, e graças a Deus por essas promessas não feitas, pelo tempo que nem
sempre será bom, pelas súbitas vontades de ir embora pra Pasárgada, pelos
finais que nem sempre serão felizes (mas nem sempre serão finais...). Graças a
Deus por amigos terapeutas que não prometeram me livrar das frustrações.
Viver é quase nada de um mar calmo.
Viver é quase nada de um mar calmo.
Um comentário:
Como sempre: simplesmente perfeito!!!
Adorei o post... me peguei rindo em vários trechos e amei seu ponto de vista ;)
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